Diario de Bordo

Escola da Ponte: um projeto de educação possível, vivo e necessário 

Piti Azevedo

02 jun 2025

5 min de leitura

Em um mundo onde muitas escolas ainda operam sob modelos rígidos e formatos padronizados, a Escola da Ponte se destaca como um exemplo de que é possível fazer diferente. Localizada em Vila das Aves, Portugal, essa escola pública, criada em 1976, propõe uma outra maneira de viver a educação: um projeto coletivo que desafia a lógica tradicional e coloca no centro a autonomia, o diálogo e a corresponsabilização.

Na Ponte, os espaços não são salas de aula no sentido convencional, mas ambientes de trabalho abertos, onde livros, dicionários, computadores e outros recursos estão ao alcance de todos. Os alunos são acompanhados por professores que atuam como orientadores educativos, assumindo o papel de tutores e parceiros na aprendizagem. Não há um currículo fechado, mas uma construção dinâmica de saberes, ancorada em seis dimensões: linguística, lógico-matemática, naturalista, identitária e artística, pessoal e social.

A escola funciona como uma pequena comunidade democrática, em que crianças e jovens são convidados a tomar decisões, resolver problemas, planejar o próprio tempo e participar ativamente da construção do espaço coletivo. Dispositivos como o plano da quinzena, o plano do dia, o “eu já sei”, o “preciso de ajuda”, o “posso ajudar em…”, a Comissão de Ajuda, a Assembleia de Escola, o Clube de Leitores e o Jardim da Poesia são exemplos concretos de como a escola transforma a teoria da autonomia em prática cotidiana.

O Contrato de Autonomia é um dos pilares dessa organização singular, conferindo à escola uma estrutura de gestão própria, com órgãos como o Conselho de Direção, o Conselho de Gestão, o Conselho de Projeto e o Conselho de Pais/Encarregados de Educação. Essa estrutura reflete a ideia de uma escola gerida por todos, onde a participação efetiva da comunidade é fundamental para sustentar o projeto.

A Escola da Ponte também integra o Programa Eco-Escolas, reconhecido pela Associação Bandeira Azul da Europa (ABAAE), reforçando o compromisso com a sustentabilidade e a educação ambiental como parte da formação cidadã.

Em 2023/2024, a autoavaliação da Escola da Ponte trouxe uma análise profunda e participativa do trabalho desenvolvido. Com mais de 90% de participação de alunos e encarregados de educação, o relatório destaca a qualidade do clima escolar, a valorização da diversidade, o respeito mútuo, a promoção da autonomia e a capacidade da escola de acolher e apoiar todos os alunos, inclusive aqueles com medidas adicionais de apoio à aprendizagem e à inclusão. Mais de 85% dos alunos afirmam sentir-se respeitados, valorizados e ouvidos, e a escola mantém uma taxa de abandono escolar nula. O relatório reafirma que a Ponte é um projeto sólido, vivo e necessário, destacando recomendações como o fortalecimento da tutoria, a ampliação dos espaços de escuta e a continuidade das práticas democráticas e colaborativas que sustentam o projeto.

Tive a alegria de conhecer de perto essa escola que, por tantos anos, me inspirou a sonhar com outras possibilidades de educação. Esta não é a primeira vez que a Diálogos visita a Escola da Ponte. Já estivemos aqui algumas vezes, e a experiência é sempre assim: tocante, provocadora, inesquecível. Cada encontro com a Ponte renova o desejo de sonhar com outras escolas possíveis, e a certeza de que, sim, outra educação é viável.

A Diálogos realiza viagens pedagógicas pelo mundo. Já são 75 viagens realizadas, e esta foi a sexta vez que trouxemos educadores brasileiros para viver experiências pedagógicas em Portugal. Além da Ponte, visitamos a Escola Artística António Arroio, em Lisboa, uma escola secundária pública dedicada às artes visuais e audiovisuais, onde os alunos têm a oportunidade de explorar diferentes linguagens artísticas e desenvolver projetos autorais, conectando teoria e prática em um ambiente de intensa criatividade. Também tivemos a honra de participar de uma aula especial com o professor António Nóvoa, reitor honorário da Universidade de Lisboa, que nos provocou a pensar sobre o futuro da escola, a função social do conhecimento e o papel dos educadores na sociedade contemporânea.

E já temos novidades para o próximo roteiro em Portugal: a Diálogos trará um novo grupo de educadores para uma experiência formativa em colaboração com o Vindas, coletivo conduzido por David Rodrigues e Luzia Lima-Rodrigues, que promove encontros para pensar a educação inclusiva e democrática, em diálogo com práticas contemporâneas. 

Estar na Ponte é aprender a perguntar antes de responder, a colaborar antes de competir, a cuidar antes de cobrar. É entender que escola não é lugar de entregar tarefas prontas, mas de construir, juntos, caminhos possíveis.

A Escola da Ponte segue de pé, porque sua raiz não está num prédio, num método, nem mesmo num nome, mas em uma maneira de estar no mundo.

Uma resposta para “Escola da Ponte: um projeto de educação possível, vivo e necessário ”

  1. Stefani de Mendonça Rossi disse:

    O trabalho desenvolvido pela Escola da Ponte é verdadeiramente inspirador e representa uma revolução no modo de pensar a educação. Com uma abordagem centrada no aluno, que valoriza a autonomia, o diálogo e a construção coletiva do conhecimento, a escola rompe com os moldes tradicionais e mostra que é possível promover uma aprendizagem mais significativa e humana. É admirável ver como o respeito pelas individualidades e o estímulo à responsabilidade transformam a escola num espaço de cidadania ativa e crescimento integral. Um verdadeiro exemplo a ser seguido por educadores em todo o mundo!

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