Na lista dos chamados ‘santos remédios’, aqueles que nossas avós nos receitavam sem nenhum medo de errar, como os chás de erva-doce ou cidreira, compressas de água morna e sal, apertar o “galo” na cabeça com uma faca em cruz ou os vidros de álcool com arnica para as irritações da pele, temos também o brincar como componente da lista.

Entretanto, junto à sabedoria centenária de nossos antepassados, para o caso do brincar temos a chancela da ciência a corroborar a tese. Vamos falar um pouco sobre isso?

Para os casos de enfermidades

Há muito tempo a medicina já vem constatando que sorrir, brincar e se descontrair são excelentes tratamentos coadjuvantes para quaisquer doenças. Não apenas como forma de amenizar os sofrimentos, mas efetivamente potencializar a ação de eventuais medicamentos que estejam sendo ministrados.

Nestes casos, possibilitar às crianças (e aos adultos!) o brincar, promove um aumento significativo de suas autoestimas e quando brincam em maior número, desenvolvem uma espécie de “força coletiva” no enfrentamento de seus tratamentos.

 

 

O brincar para o corpo

Desde os primeiros movimentos da criança quando o brincar se resume a um chacoalhar de pequenos objetos, já estamos propiciando a elas o exercício mais refinado de seus sentidos e promovendo o fortalecimento de seus músculos.

Olhando com atenção para os brinquedos, sentindo suas texturas, observando seus sons, experimentando seus aromas e até seus sabores elas ganham, ao longo do tempo, maior repertório de suas impressões sensoriais.

Momento posterior, seus corpos seguem ganhando autonomia e o andar vai expandindo suas possibilidades de exploração espacial. As brincadeiras vão ganhando maior vigor com as corridas e escaladas, e os corpos se inundando de alegria e força física. 

Esta relação entre as brincadeiras e os corpos vai se tornando cada vez mais estreita, em especial em espaços repletos de natureza, onde possam sentir o chão, a terra, as plantas, onde possam respirar ar mais puro e avistem as belezas naturais. 

Benefícios cognitivos do brincar

A imersão da criança nas brincadeiras é a forma mais profunda e completa para desencadear nela os processos de aprendizagem. A construção de sua autonomia, as questões reflexivas, a criatividade e a capacidade de resolver problemas, tudo isso num ambiente onde possam construir e desenvolver suas próprias ações de brincar.

Não bastasse, o brincar coletivamente também robustece as questões afetivas e sociais das crianças. A facilidade com que se aproximam entre si a partir de seus interesses comuns, faz com que aprendam a lidar com questões como: compartilhar, conviver, interagir, para conhecerem melhor a si e aos seus semelhantes.

 

As emoções nascidas do brincar

Nem é preciso descrever a sensação de felicidade que se instala nas crianças enquanto brincam. Mas as possibilidades emocionais que as brincadeiras oferecem vão além do estar feliz.

Quem nunca se deparou com a sensação de frustração geralmente surgida na hora de ir embora dos parques? Ou o descontentamento provocado por qualquer contratempo inesperado? 

E por mais que para eles e para nós, educadores e familiares, seja um incômodo e nem um pouco agradável, mesmo neste exercício das emoções que demandam mais sofrimento existe um aprendizado. Administrar as frustrações também tem sua importância.

Transitar entre a alegria e a tristeza, a euforia e a frustração, desvendar as fronteiras entre o que é possível e o que ainda não pode ser alcançado compõem a formação de nossa infinidade de possibilidades emocionais. E elas se iniciam também no brincar.

Brincadeiras estimuladas ou livres?

Os especialistas em infâncias defendem a tese de que o brincar livre é a forma mais original de expressão da criança, e acreditamos que isso seja definitivo. Mas o mundo e as possibilidades de nossa sociedade atual nos apresentam muitas impossibilidades.

Especialmente nos grandes centros os espaços de brincar estão cada vez mais raros, menores e mais restritivos. Não é fácil encontrarmos um bosque, um rio ou um espaço para exercício de liberdade como aqueles desfrutados no século passado.

Nossos parques (ou pelo menos parte deles) são equipados com balanços, escorregadores, pequenas trilhas, ilhotas acessíveis por pequenas pontes, gangorras e tanques de areia. Eles são muito desejáveis e têm papel importante. 

Apesar de serem estimuladores do brincar, ainda apresentam todas as ofertas e demandas que a infância necessita para as ações do corpo, da mente e das convenções sociais. Sendo assim, abarcam as brincadeiras com uma espécie de custo/benefício mais racional.

Mas vale uma atenção especial para as brincadeiras disponíveis no mundo eletrônico, especialmente aquelas ofertadas nos ambientes virtuais. Nosso mundo está caminhando a passos largos para os espaços digitais, e isso nos parece algo impossível de frear e as crianças de alguma forma precisam aprender a conviver com eles.

Ao contrário dos escorregadores e balanços, as brincadeiras digitais merecem o olhar atento dos adultos. Para estas atividades, os corpos se tornam inertes, os sentidos são resumidos ao tato no “touchscreen”, mas olhos perdem a profundidade. Sobram apenas as emoções. Poucas delas.

Neste ponto deve residir nossa reflexão. Não para determinar juízo de valor, mas para encontrar uma dosimetria que seja suficiente a não permitirmos que percam os desejos dos corpos, a alegria dos encontros pessoais e a satisfação nascida das conquistas. Que não se transformem em robôs.

E os adultos? 

Brincar não é uma exclusividade das crianças. Em cada um de nós reside uma criança em silêncio, aguardando apenas uma oportunidade. Sendo assim, brincar é para quem está disponível.

Quando pessoas de mais idade se reúnem à mesa para um jogo de “buraco” ou “pif-paf”, quando amigos se reúnem para uma partida de futebol do estilo: “casados contra solteiros”, ou mesmo quando dançamos com nossos parceiros nas festas, o que estamos realmente fazendo é dizendo “sim” para a que nossa criança interior brinque. O brincar nunca morre.

Então façamos nossas compressas e tomemos nossos chás, para que saibamos que existe remédio para tudo, mas que tenham certeza de que BRINCAR É PARA TODOS!