A arte ocupa um lugar especial na vida humana. Mais do que fonte de prazer estético, as linguagens artísticas são capazes de transformar experiências cotidianas e promover conexões profundas, seja com o mundo, seja consigo mesmo. Estudos recentes têm reforçado o impacto positivo da arte na saúde e no bem-estar, mostrando que transcende o campo cultural e assume papel essencial no cuidado com a vida.

Um relatório encomendado pelo Departamento de Cultura, Mídia e Esporte do Reino Unido, com apoio da Organização Mundial da Saúde (OMS), trouxe evidências contundentes sobre os benefícios da arte e da cultura. Entre os principais achados da pesquisa estão a redução de sintomas de depressão, a melhora na qualidade de vida e a diminuição de custos com saúde pública. 

Engajamento em atividades culturais – visitar museus, cantar em corais ou participar de peças teatrais – tem se mostrado eficaz na redução da dor, no aumento da satisfação pessoal e no atraso do declínio cognitivo, especialmente em idosos. Esses resultados reforçam o lugar da arte como recurso indispensável para a saúde das pessoas.

Outro exemplo vem da área médica. Um estudo da Revista de Medicina da USP destacou como a integração da arte à formação de médicos promove uma prática mais humana e empática. Atividades como literatura, música e artes visuais ajudam profissionais de saúde a desenvolverem habilidades de escuta, comunicação e resiliência emocional. Além disso, tais práticas são eficazes na redução do estresse e no enfrentamento do esgotamento dos profissionais, oferecendo aos médicos ferramentas para lidar com os desafios emocionais de sua rotina.

As duas pesquisas revelam algo fundamental:  arte não é luxo, mas necessidade. Permite acessar espaços de introspecção, cura e expressão que, de outra forma, seriam inacessíveis. Em um mundo repleto de pressões e desafios, a arte oferece uma pausa, um momento de reconexão com aquilo que nos torna humanos.

A arte como caminho para o bem-estar na educação

Se os benefícios da arte são inegáveis para a saúde e o bem-estar, por que não estendê-los àqueles que dedicam suas vidas à formação das futuras gerações?

Quando falamos de currículo, a dimensão artística é indiscutível para a formação integral dos alunos. Pela arte, crianças e jovens se expressam, criam e aprendem por meio das mais diversas linguagens. Contudo, este texto não é sobre alunos. É sobre professores – e a necessidade de também oferecer a eles a oportunidade de acessar, fruir e se reconectar com a arte, não como ferramenta de trabalho, mas como espaço de expressão pessoal, alívio emocional e renovação.

Para os professores, a arte não deve ser vista apenas como recurso pedagógico, mas como caminho para cuidar de quem cuida. A fruição artística é mais do que um ato de consumo cultural: é uma forma de resgate do humano que tantas vezes se perde no dia a dia das escolas.

Esta consciência também deve se estender aos gestores – como fruidores da arte, sim, mas também como líderes responsáveis pelo bem-estar de suas equipes.

O desafio da saúde mental dos professores

A saúde mental dos professores é um desafio urgente. Um estudo da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) apontou que um terço dos professores da educação básica no Brasil sofre de síndrome de Burnout, caracterizada por esgotamento físico e emocional, despersonalização e baixa realização pessoal. Além disso, fatores como violência escolar, baixos salários e pressão por resultados contribuem para agravar essa situação.

Esses dados refletem uma crise global: no Reino Unido, 84% dos professores relataram problemas de saúde mental relacionados ao trabalho no último ano. Nos Estados Unidos, mais de 60% dos educadores disseram se sentir frequentemente esgotados. Essa realidade exige soluções que vão além do apoio técnico ou profissional: é preciso olhar para o cuidado emocional e humano desses profissionais.

Políticas de bem-estar nas escolas

A promoção do bem-estar nas escolas passa pela valorização profissional dos professores, e vai além. Trata-se de um compromisso da gestão (pública ou privada) com a criação de ambientes saudáveis, que favoreçam tanto o aprendizado dos alunos quanto a saúde mental e emocional dos educadores. Algumas políticas que podem ser implementadas incluem:

  1. Eventos culturais internos e externos: organizar atividades artísticas e culturais dentro da escola, como exibições de filmes, saraus e apresentações musicais para os professores. Da mesma forma, por que não incluir equipes pedagógicas nas atividades externas, como ida a museus e outros espaços de arte e cultura?
  2. Cursos: incluir no plano de formação de professores atividades que incentivem os professores a explorar sua criatividade e fruição artística.
  3. Campanhas de conscientização: promover uma discussão aberta sobre saúde mental, desestigmatizando os desafios enfrentados pelos educadores.
  4. Subsídios para experiências culturais: Oferecer vouchers ou descontos para professores em museus, teatros, cinemas e outros eventos culturais como forma de enriquecer o lazer dos educadores.

Encontrando arte no cotidiano

As escolas devem criar ambientes que valorizem a arte, mas os professores também podem buscar formas de integrar a arte ao seu dia a dia de maneira espontânea. Participar de atividades culturais não precisa ser algo grandioso: pequenos gestos podem trazer benefícios. Como indica a pesquisa:

  • Assista a um filme ou peça de teatro: permita-se envolver em histórias que toquem sua imaginação e emoções.
  • Leia por prazer: escolha livros que despertem curiosidade ou tragam conforto. A literatura é um convite a explorar novos mundos sem sair de casa.
  • Dance ou ouça música: movimente o corpo ou relaxe ao som de suas músicas preferidas, permitindo que a arte se conecte ao físico e ao emocional.
  • Aprecie o visual: visite uma exposição ou simplesmente observe uma obra de arte, mesmo online. Esses momentos podem trazer calma e inspiração.

Dedicar tempo à arte representa uma forma de cuidar de si. É uma oportunidade de reconexão com o que há de mais humano e de buscar equilíbrio em meio às pressões naturais da vida profissional.

Ao combinar políticas de bem-estar com ações individuais, criamos um ciclo virtuoso em que o cuidado emocional dos professores se reflete na qualidade da educação e no ambiente escolar como um todo. De novo, arte não é luxo, mas uma intrínseca vocação humana.

Ana Paula Azevedo

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Fontes Utilizadas:

  1. Organização Mundial da Saúde (OMS). Culture and Heritage Capital: Monetising the Impact of Culture and Heritage on Health and Wellbeing. Relatório encomendado pelo Departamento de Cultura, Mídia e Esporte do Reino Unido, com apoio da OMS. Disponível em: https://www.gov.uk/government/publications/culture-and-heritage-capital-framework.
  2. Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Síndrome de Burnout atinge um a cada três professores infantis, aponta estudo. Publicado pela CNN Brasil. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/saude/sindrome-de-burnout-atinge-um-a-cada-tres-professores-infantis-aponta-estudo.
  3. Revista de Medicina da USP. Contribuições transformadoras das artes para estudantes e profissionais de saúde. Publicado no Jornal da USP. Disponível em: https://jornal.usp.br/ciencias/artigo-mostra-as-contribuicoes-transformadoras-das-artes-para-estudantes-de-medicina.