No Senegal, uma ilha chamada Goré, próxima à Dakar, a capital do país, funciona hoje como um centro de visitação de turistas. Mas ali, entre os séculos XV e XIX, funcionou um dos principais centros de comércio de pessoas escravizadas na África, estabelecido inicialmente pelos portugueses. Neste lugar, crianças eram separadas, assim como mulheres e homens. Cada um tinha um destino, não importava se eram da mesma família, se tinham semelhanças nos locais em que nasceram, se havia laços em comum. Ali, em um largo cômodo de uma das edificações que sustentavam o comércio, uma ganhou um nome especial. Uma porta, de onde não se via o continente, mas apenas o Oceano Atlântico. Ficou conhecida como “Porta do Nunca Mais”. Dali saiam nos navios em direção à América. Quem passava por esta porta não voltava mais.
Por mais de 300 anos, milhões de africanos foram forçados a deixar suas terras e famílias, trazidos em condições desumanas para trabalhar nas plantações e minas no Brasil. Na terra em que chegaram, não havia direitos para eles, nem laços culturais ou afetivos. Os que sobreviviam ao longo trajeto de navio eram, muitas vezes, vendidos em praças públicas, condicionados a uma vida inteira de subalternação. Esse sistema brutal de exploração não apenas causou imenso sofrimento e perda de vidas, mas também estabeleceu uma estrutura de desigualdade racial que persiste até hoje. Quantas pessoas negras você conhece em lugares de liderança? Você já foi atendido por quantos médicos negros?
O Brasil foi o último país do mundo a abolir a escravidão. A assinatura da lei foi em 1888, há exatos 136 anos. Poucas garantias foram dadas para reparar os danos de séculos de exploração. Hoje, cabe a nós, educadores, construir alicerces para se construir uma sociedade antirracista, inclusiva, que combata a discriminação tão presente. O chamado racismo estrutural é justamente aquele que está na estrutura do pensamento, que condiciona a pessoa negra a qualquer situação de inferioridade. Nem todas as pessoas querem ser racistas intencionalmente, mas a herança cultural nos acompanha. Muitas vezes somos.
No ambiente escolar, é crucial que as crianças entendam esse passado para que possam reconhecer e combater as injustiças que ainda existem. A educação antirracista deve ser sensível, mas direta, abordando o impacto duradouro que esse período histórico teve sobre a população negra no Brasil. Isso inclui a compreensão de como a escravidão determinou as relações raciais e sociais e como esses efeitos se manifestam nas desigualdades contemporâneas. Ao educar as crianças sobre esse passado, estamos preparando uma nova geração para construir uma sociedade mais justa e equitativa. Isso envolve ensinar sobre a resistência e as contribuições dos afro-brasileiros à cultura, economia e identidade nacional, promovendo um ambiente de respeito e valorização da diversidade. As escolas são um dos primeiros espaços de socialização formal para as crianças, onde elas começam a compreender e internalizar valores. Ignorar ou minimizar as questões raciais nesse contexto pode perpetuar desigualdades e injustiças que afetam profundamente a vida das crianças.
Desde cedo, as crianças observam e absorvem comportamentos e atitudes ao seu redor. Elas notam as diferenças de cor de pele, origem e cultura. É essencial que o ambiente escolar reconheça e valorize essas diferenças, promovendo um espaço onde todas as crianças se sintam vistas, ouvidas e respeitadas. Quando estas questões são tratadas, as crianças aprendem a valorizar a diversidade. Elas entendem que cada indivíduo, independentemente de sua cor da pele, merece respeito e dignidade.Para isso, é importante que educadores recebam formação adequada e contínua sobre diversidade e inclusão. Eles devem estar preparados para lidar com incidentes de racismo e discriminação, além de incorporar materiais didáticos que representem a diversidade.
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