Quem se recorda de ouvir de nossas mães ou avós a expressão: “ponto cruz”, entremeada em qualquer outro assunto? As velhas roupinhas de bebê, que um dia nos vestiram, e hoje repousam em nossa memória (e algumas ainda insistem em compor o fundinho de nossas gavetas) muito certamente apresentam nossos nomes, ou nossas iniciais, fincadas com tanto amor pelas bordadeiras que compõem nossa história.
Bordar para alguém sempre foi um gesto muito generoso. Entregar ao outro seu tempo de confecção, de concentração e de arte. Assim como cozinhar pra quem se ama, bordar é uma demonstração de amor e cuidado.
Mas este é apenas o registro dos bordados em nossa história particular. Fato é que os registros arqueológicos registram esta forma de arte desde a pré-história. O trançar de agulhas nos acompanha e nos compõe, desde sempre. Cada povo, em cada canto de nosso planeta, desenvolveu suas técnicas específicas, a partir de seus utensílios e tecidos disponíveis, para gravarem, também registros de nossa evolução como espécie.
Os primeiros registros do ponto cruz foram encontrados em vestes que cobriram nossos ancestrais, com data aproximada de 30.000AC. Lá em suas cavernas, onde o mundo exterior certamente era bastante hostil, já encontravam afeto, entrega e certamente necessidades a ensejar a criação de pequenas “amarras” para os tecidos. Posteriormente é que o ponto cruz passou a ser usado como “aplicação”, e as nuances artísticas passaram a surgir. As civilizações antigas passaram a difundi-lo com bastante intensidade, e é possível reconhecer sua presença nas esculturas e monumentos gregos datados de 2000AC. Uma preciosidade. O mesmo aconteceu em outros povos, como os chineses, por exemplo.
O tempo passou e os bordados estão presentes em nossa vida, ainda hoje. Tecnologia nas máquinas industriais, avanços gráficos, tecidos e linhas com uma infinidade de cores, resistências, de origem limpa, reciclados, e tantas variantes que sequer podemos conhecer em sua totalidade, e o velho ato de bordar está vivo! Técnicas novas surgiram nos quatro continentes, e o avanço das comunicações foram capazes de espalhá-las entre todos, miscigenando-as. O que já era rico, ganhou muito vigor.
Bordar com carinho é garantir uma marca no outro, anotar nas vestes este carinho, apertando as linhas que nos envolvem, entrelaçando sentimentos, tecidos, pessoas, convívio… Quantos pontos nos formam… tantos pontos a compor uma única letra… inúmeros deles em cada palavra, cada pétala… São incontáveis.
Olhe ao seu redor, em suas roupas, em seus armários. Encontre e identifique seus bordados, quem os fez, de onde vieram e o que significam. E observe o quanto eles fazem mais sentido, à medida em que seus pontos são marcados por sua história, por seus entes queridos, seus momentos de convívio, quem sabe hoje de saudade.
Encontre em cada ponto o significado que ele imprime em você, e na longa peça de tecido que estamos a construir. A vida.